A Defensoria Pública da União na Paraíba conseguiu firmar acordo para suspender por 120 dias o processo judicial que determina a retirada de uma comunidade de pescadores da praia de Jacarapé, no litoral sul paraibano. O acordo também permitiu o religamento imediato da energia nas residências dos moradores do local, serviço que havia sido suspenso em razão de decisão judicial. O prazo é para que a DPU e o Ministério Público Federal na Paraíba apresentem um laudo antropológico que comprove a tradicionalidade da comunidade, e também para que solicitem a regularização fundiária do território.
Desde 2004, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) pediu a demolição das casas da região, sob a alegação de que área ocupada pertencia a União e os moradores não tinham licença para ocupar o local. O órgão ajuizou uma Ação Civil Pública (ACP), em 2004, com o objetivo de proibir alterações estruturais nos imóveis, com sua posterior demolição e obrigando os moradores a reparar os possíveis danos ambientais causados. A Justiça Federal havia atendido o pedido do IBAMA e, no início do mês de maio de 2018, a concessionária Energisa retirou os medidores das casas, deixando mais de vinte famílias sem energia elétrica.
Entretanto, no processo movido pelo Ibama, não haviam sido avaliados os indícios de que a área poderia ser considerada uma comunidade tradicional. “Quando a comunidade chegou até a DPU, trouxe uma tese de doutorado defendida na Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Gustavo Baez, na qual ele aponta aspectos de tradicionalidade nessa comunidade de pescadores artesanais. Quando uma comunidade é considerada tradicional, existe toda uma legislação e proteção normativa específica. Outro ponto importante é uma nova lei de regularização fundiária, de 2017, que inaugurou a previsão legal do Termo de Autorização de Uso Sustentável (TAUS), um instrumento específico para regularizar territórios de comunidades tradicionais”, explicou a defensora pública federal Diana Freitas de Andrade.
Segundo o estudo, as primeiras caiçaras foram construídas na década de 1990 em Jacarapé. “Depois da atuação da DPU e do acordo obtido com a Procuradoria Federal do Ibama e o Ministério Público Federal, a Justiça Federal suspendeu a ordem de demolição dessas casas. Por mais que seja uma suspensão do processo, não deixa de ser uma vitória expressiva, principalmente pelo estágio processual avançado. Foram 14 anos de trâmite processual e não é simples, depois desse tempo, apresentar esse novo contexto de uma comunidade que merece proteção especial”, destacou a defensora.
Para a presidente da Associação de Pescadores, Amigos e Moradores (Apam), da Praia de Jacarapé, Tereza Cristina Araújo de Oliveira, a notícia trouxe alegria e esperança aos moradores. “Somos 95 famílias na comunidade de Jacarapé e na beira-mar somos 47, entre elas, pescadores artesanais e outras pessoas que não são pescadores, porém têm suas ancestralidades culturais da pesca, com seus avós, pais, entre outros. Convivemos na comunidade com uma estrutura mínima. Nós temos grande expectativa de conseguir a regularização da tradicionalidade. Quem chegar em nossa comunidade perceberá que temos uma identidade cultural local. A remoção de qualquer família da comunidade de Jacarapé, irá, com certeza, comprometer a nossa identidade sociocultural”, disse.