Moeda: Clima: Marés:
Início Colunas
Edilson Pereira Nobre Júnior

Descendente de uma família originária da cidade de Ávila, Artur Rivas, empregado graduado – na verdade, strategic advisor, como gosta de ser identificado – de uma multinacional, vinha passando por maus bocados. Não quanto à profissão em si, pois – como exige a sua ascendência espanhola – gaba-se por ser um excellentbusiness expert.    

​​O problema derivava de uma questão menor, mas que, de qualquer modo, ligava-se com o trabalho. Artur estava prestes a completar seus sessenta anos – bem vividos, diga-se – e, desde uns dez anos antes, a cor dos seus mais tão não vastos fios de cabelos aderira em definitivo ao tom marfim. 

​​O episódio, que é próprio do passar do tempo, estava causando a Artur vários e perenes constrangimentos. Necessitando realizar as suas viagens, para o cumprimento de seus múltiplos deveres profissionais, passou a sofrer abordagens que, embora cordiais, afligiam-no.  

​​O suplício começava no checkin, ao instante no qual a atendente da companhia aérea lhe negava o pedido de sentar-se no corredor, porque a poltrona disponível se localizava em saída de emergência, prosseguindo quando ingressava no setor de embarque dos aeroportos, onde, quase sempre, um dos empregados da concessionária do aeroporto lhe indicava, gentilmente, a possibilidade de adentar pelo corredor prioritário. O mesmo se repetia quando da chamada para a decolagem do voo, instante no qual havia pelo menos um passageiro insistindo que ingressasse na fila das prioridades por lei, e, como se não bastasse, se a hipótese fosse de embarque remoto, sempre havia alguém lhe oferecendo um lugar para que pudesse sentar. 

​​Esses transtornos, apesar de sempre acompanhados de uma fidalguia sincera, provocavam um abalo no astral de Artur, diminuindo uma parcela sensível de seu ânimo.

​​Numa tarde chuvosa, após embarcar no Aeroporto de Congonhas, sentou-se na fila 18, corredor. Durante o voo, que parecia estar em céu de brigadeiro, encontrava-se Artur atento à fascinante leitura de Carlota Fainberg, de Antonio Muñoz Molina, quando uma passageira ao seu lado, com um olhar maroto, puxou conversa. Precisava desabafar e passou a narrar a Artur as suas agruras. Convivia com um companheiro há sete anos, vindo este a falecer sem filhos há um mês, deixando-lhe a expectativa de uma benfazeja herança e pensão. Chamava-se Milena e disse que contava com quarenta anos de idade.

​​O mais importante, porém, foi a confissão de que, ao depois de amar alguém mais velho, pois o seu companheiro falecera com sessenta e seis anos, jamais voltaria a ter um relacionamento com alguém mais novo. Era completamente diferente o parceiro da terceira idade. E isso – insista-se – nada tinha a ver com a concepção, erroneamente propalada, de que o sucesso econômico masculino, demonstrativo de uma capacidade de vencer, é um sintoma de virilidade.

​​Nada disso. Afirmou, sem rodeios, o fascínio que o amante de mais idade possui em galanteios e romantismos que, apesar dos tempos modernos, tocam irresistivelmente o coração de uma mulher.

​​O avião pousou em Salvador. Para Artur consistia numa escala, na sua viagem para Pernambuco. Para Milena, uma conexão. Ao se despedir, esta, com suavidade, pediu-lhe desculpas, pois a sua idade era, na verdade, de trinta e oito anos. 

​​Novamente a trinta e três mil pés de altitude, Artur reabriu o seu Carlota Fainberg e, coincidência ou não, defrontou-se com a narrativa de um dos protagonistas da novela sobre a personagem principal, quando dizia ser uma mulher fantástica demais, mas perigosíssima em sua paixão. 

​​Aliviado, Artur percebeu que a terceira idade proporciona um bem-estar de vida que necessita ser vivido com a satisfação que somente a maturidade – e jamais a juventude – é capaz de proporcionar.  

publicidade
publicidade
© Copyright 2024. Portal Correio. Todos os direitos reservados.