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Edilson Pereira Nobre Júnior

Alguns amigos – e não são poucos – dizem que já leram essa história noutro lugar. Uns, em romances; outros, em contos ou até mesmo crônicas. Torço para que tenha sido em folhetins, pois sempre há a esperança de um final feliz nos próximos capítulos.

A minha versão confesso que a ouvi do Bicalho acerca de um amigo comum de juventude, mas que hoje se encontra distante geograficamente. É o Juca, sem Chaves ou Oliveira como sobrenome, mas que na chamada da escola atendia como José Ribas Bastos.

Na sua vida, não somente feita de altos, casou-se com a sua primeira e única namorada, a Leonor. Não teve aventuras românticas prévias, pois a vigilância de sua sogra, Dona Aurélia, era infalível. Em compensação, da união veio um casal, formado por Júlio e Lorena. Aos trinta anos, quando completaria cinco de matrimônio, Leonor vem a falecer, acrescentando-lhe à paternidade o encargo de também ser mãe.

Aos cinquenta anos de idade, a convivência com os filhos, já formados, não era das melhores. O descompasso de gerações fez com que estes o tivessem como ultrapassado no estilo de vida e, portanto, um chato. Nenhum conselho era bem-vindo, apesar das insistências que se fazem não contidas nas preocupações de pai.

O cotidiano do Juca foi se tornando insosso e marcado por uma solidão, somente amenizada pelos instantes no trabalho, nos serões que lhe exigiam a função de superintendente regional de um grande banco privado.

Numa manhã chuvosa e com trovões, veio a conhecer Diana, não uma caçadora, mas uma jovem tímida, vinte e cinco anos mais nova, e que foi admitida como escriturária. Aos poucos, passou Juca a sentir pela nova funcionária um apreço que extravasava da admiração profissional até ao incômodo por esta namorar com o Júlio, cujo fulgor juvenil era impossível de igualar.

Sabedor de que o relacionamento se esvaíra, o Juca ariscou um convite para um almoço, repetindo-o para um jantar num astral romântico. Porém, o nosso personagem, conhecido como o príncipe da galanteria, tornou-se um plebeu à frente de sua musa. Inesperadamente, esta foi quem, liberando-se de sua timidez, lançou-se a atitudes mais instigantes, especialmente o avanço para o beijo inicial, do qual seguiram-se muitos outros, mesclados com os abraços que se estreitavam com a ansiedade natural dos amantes.

Foram instantes de idílios, vivenciados aos finais de semanas, num apartamento que, alugado para esse fim, transformou-se num ninho de amor. Num domingo, 15 de setembro, no qual mais uma vez chovia torrencialmente, amaram-se com excessos e sem reservas de ternura que o desejo se tornou puro, quase imaculado.

Três dias após, Juca atendeu uma ligação de Diana. Esta comunicava-lhe que não poderia continuar com o relacionamento, apesar de maravilhoso. É que conheceu o Henrique, com quem vai tentar a vida no exterior. Afinal, encontrara o tão desejado amor de sua vida.

Cessadas as emoções da notícia, que já esperava viesse algum dia, pois sempre deixou claro que não poderia assumir Diana como se casados fossem, Juca enfim pediu a sua aposentadoria e virou um talássico. Mas, nos sábados à noite, agora sem embalos, continuou a degustar o seu côte du rhône, com a sonoridade de “A moça do sonho”, de Edu Lobo, pois assim, ao contemplar a imensidão atlântica de sua varanda, poderia, sonhando, recordar o amor que só uma faísca de loucura foi capaz de afiançar.

Edilson Pereira Nobre Júnior é magistrado, professor e membro da Academia Norte-Rio-Grandense de Letras.

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