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Professor Trindade

​Todas as pessoas procuram, é óbvio, a felicidade, o que equivale ao que chamamos de “bem”. ​

Evidentemente, não estamos nos referindo a bem material, que pode trazer, ou não, felicidade; estamos nos referindo a uma forma de conduta que se encontra no domínio da ética, uma ordenação teórico-prática dos comportamentos, em geral, na medida em que se destinam à realização de um bem. ​

A realização de um bem, do ponto de vista do Direito, caracteriza-se por dois ângulos:

a) O valor da subjetividade do autor da Ação;

b) O valor da coletividade em que o indivíduo atua.

(Miguel Reale: “Lições Preliminares de Direito”).

No primeiro caso, aprecia-se o ato pela intencionalidade do agente, o qual visa à plenitude de sua subjetividade; ou seja: o bem-estar dele próprio.

No segundo caso, o que interessa é o bem da coletividade; o bem coletivo E esse é o valor a ser perseguido, prioritariamente, pelo Direito, embora ele não deixe de garantir, também, o valor individual, ficando este em segundo plano.

A Justiça é sempre um laço entre um ser humano e outros seres humanos. Para ela, só é levado em conta o bem do indivíduo enquanto membro da sociedade; portanto, eu não posso pensar só no meu bem, em detrimento do bem os outro.

Baseado nesses aspectos é que consideramos inadmissível e inconstitucional a portaria assinada pelo ministro do Trabalho e Previdência, Onyx Lorenzoni, proibindo a demissão de funcionários que se recusam a tomar a vacina contra a Covid-19 no país. A norma foi publicada segunda-feira passada (1º/11) no Diário Oficial da União.

De acordo com o texto, a não apresentação de cartão de vacina contra qualquer doença não consta como motivo de justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador, nos termos do artigo 482 da CLT.

A portaria determina, entre outros itens, que o empregador é proibido de exigir quaisquer “documentos discriminatórios ou obstativos para a contratação, especialmente comprovante de vacinação”.

“Considera-se prática discriminatória a obrigatoriedade de certificado de vacinação em processos seletivos de admissão de trabalhadores, assim como a demissão por justa causa de empregado em razão da não apresentação de certificado de vacinação”, assinala o parágrafo 2º do artigo 1º da portaria.

Já o artigo 3º afirma que os empregadores que quiserem garantir condições sanitárias no ambiente de trabalho podem oferecer aos trabalhadores a testagem periódica que comprove a não contaminação por Covid-19. Nesse caso, os funcionários são obrigados a fazer os testes ou apresentar cartão de vacinação.

Caso o empregador rompa a relação de trabalho “por ato discriminatório”, diz a portaria, o empregado tem direito a receber reparação por dano moral, e a optar entre a reintegração ao trabalho, com ressarcimento integral do período afastado ou o recebimento, em dobro, do intervalo de afastamento.

​É importante destacar que, em maio deste ano, a 2ª Vara do Trabalho de São Caetano do Sul (SP) decretou a dispensa por justa causa de uma auxiliar de limpeza de hospital por se negar a tomar a vacina contra a Covid-19. Em julho, o TRT de São Paulo manteve a decisã. O TST (Tribunal Superior do Trabalho) ainda não analisou o tema, mas a presidente da Corte, Maria Cristina Peduzzi, afirmou, em entrevista recente, que as empresas têm o direito de demitir empregados que se recusem a tomar a vacina.

Em dezembro de 2020, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar ações apresentadas por partidos políticos nas quais se discutia a obrigatoriedade de vacinação contra a Covid-19, já havia decidido que o Estado poderia determinar a obrigatoriedade e impor restrições àqueles que recusassem a imunização.

O Ministério Público do Trabalho já se posicionou de forma favorável à demissão por justa causa de trabalhadores que se recusassem a tomar vacina sem apresentar razões médicas documentadas. Segundo o MPT, as empresas devem procurar conscientizar e negociar com os empregados, mas a mera recusa individual e injustificada não pode colocar em risco a saúde dos demais empregados.

A Lei 14.019/2020 estabelece que as empresas devem fornecer máscara ao trabalhador e outros equipamentos de proteção individual. Ora, se a vacina tem por finalidade imunizar os profissionais, não faz sentido determinado empregado recusar tal imunização e colocar em risco a saúde dos demais colegas de trabalho; principalmente sendo obrigação da empresa propiciar condições de trabalho seguro.

Não se justifica, portanto, uma pessoa continuar trabalhando numa empresa, ou num órgão público, sem estar vacinada; ou querer ser admitida em tal situação. Ela não tem o direito de, por uma mera vontade ou capricho, arriscar os colegas a contraírem uma doença mortal. E aqui não vale o argumento, usado por alguns, de que ninguém pode tocar no corpo de outrem sem permissão, ou invocar o direito de liberdade individual.

Conforme já dissemos (e enfatizamos agora), o bem individual não pode se sobrepor ao bem comum. Primeiro, a coletividade; depois, o indivíduo.

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