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‘Concurseiros’ investem até R$ 6 mil em estudos

Pelo menos 13 milhões de brasileiros se entregam à preparação para concursos públicos a cada ano

De longe, o concurso público é uma grande oportunidade de garantir salários melhores e realizar o sonho da estabilidade, distante dos riscos de desemprego ou das dificuldades encontradas nas empresas privadas. Porém, vendo mais de perto, para chegar até a aprovação não basta só estudar, mas investir muito dinheiro em cursinhos e materiais específicos.

Se os requisitos para nível médio, por exemplo, não trazem praticamente nada do que você estudou no Ensino Médio é hora de esquecer o conteúdo programático aprendido na escola e partir para novos aprofundamentos. Conhecimentos bancários, técnicas de contabilidade ou administrativas, previdenciárias, muitas vezes vistas somente nas faculdades, são pedidas para quem não tem graduação, o que exige um grau suado e caro de aprendizado.

Pelo menos 13 milhões de brasileiros se entregam à preparação para concursos públicos a cada ano, o que movimenta aproximadamente R$ 50 bilhões na economia nacional, com inscrições, materiais didáticos, cursinhos e confecção das provas pelas organizadoras.

Jovens ou mais velhos fazem de tudo para conseguir aprovação e chegam a gastar até mesmo R$ 6 mil com preparações e materiais específicos. Vanize Batista Rodrigues tem 25 anos, mora em Patos, a 311 km de João Pessoa, e estuda para concursos há cinco meses. Graduada em Direito, ela revela que já gastou toda essa quantia em um ano, entre cursinhos preparatórios e materiais didáticos não só para concursos, mas também para a prova da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Além do investimento pesado, ela diz que enfrentou muitas dificuldades ao fazer cobranças a si mesma, numa forma de ‘auto pressão psicológica’ para ser aprovada.

“Estou me preparando para a seleção do Tribunal Regional do Trabalho em Alagoas; as provas ocorrem no próximo dia 26. Vida de estudante é muito difícil e a maior parte das cobranças parte de nós mesmos. Passei na OAB, mas até conseguir isso eu sofri muito porque é como se fosse um concurso sem remuneração e sem concorrência. Eu me pressionava bastante para ser aprovada e conseguir um emprego para manter as outras etapas dos meus estudos. Apesar de ser bastante cansativo trabalhar e estudar, agora quero me dedicar bem mais aos concursos”, diz Vanize.

O engenheiro de produção Darci Chaves Filho, de 32 anos, mora em João Pessoa e também enfrentou muitas dificuldades até ser aprovado no primeiro concurso público. Ele disse ao Portal Correio que assumiu um cargo na Polícia Rodoviária Federal, em 2006, mas deixou a oportunidade quatro meses depois para se dedicar à vida de empresário, junto com o pai e outros sócios. Segundo Darci, a ideia não deu certo e ele voltou à jornada de ‘concurseiro’, até ser aprovado em 2013. O engenheiro vai assumir um cargo na gerência no Ministério da Fazenda até o final de janeiro deste ano. Só havia duas vagas na Paraíba e a concorrência era de 160 no estado. Ele conta que já gastou R$ 3,5 mil com os estudos.

“Para a PRF foi algo bem improvável. Eu li algumas apostilas e acabei passando. Já para o Ministério da Fazenda eu investi mais em outras formas de estudos além dos materiais didáticos, como aulas telepresenciais, por exemplo. Costumava estudar de seis a oito horas por dia. O segredo é manter o foco e a persistência, mesmo diante de dificuldades”.

Valeska Hilário Trindade, de 23 anos, é formada em Direito pela Universidade Federal de Campina Grande e mora em Patos. Ela também costuma estudar de seis a sete horas por dia. Além de cursinhos preparatórios para concursos, Valeska se dedica a uma pós-graduação, aos finais de semana. Sobre os gastos com os estudos, ela fala que são altos, em torno de R$ 600 por mês, mas aproveita muito material gratuito disponível na internet e tem a ajuda financeira dos pais porque ainda não trabalha. Orgulhosa, ela conta como ficou feliz por ter passado na OAB na primeira vez que fez a prova, mas lamenta pelo fato do advogado não ter um bom salário no mercado.

“Advogar não é bom! O salário em escritórios é baixo e a carga de trabalho para os jovens recém-formados é muito maior. Meus pais têm muita paciência, reconhecem meu esforço e me ajudam para que eu só estude. Depois de passar na OAB e concluir minha graduação, agora só me dedico para concursos”, explica.

Foco e amparo psicológico

A empresária Isabelle Serrano, uma das sócias das franquias da Damásio Educacional em João Pessoa, Patos e Cajazeiras, afirma que não basta só ter dinheiro para investir na preparação, mas também amparo psicológico para lidar com a pressão que muitos enfrentam por se sentirem obrigados a ter que alcançar a aprovação, mesmo que essa cobrança parta da própria consciência do candidato.

“Muitos fazem concursos porque querem melhorar o salário, ou porque a família inteira já foi aprovada, os pais veem isso como uma meta de crescimento, mas as vezes falta perceber que é preciso buscar uma identificação com as matérias estudadas e com o cargo que se pretende assumir. Isso influencia no cotidiano dessas pessoas, que, ao passarem para uma cargo no qual desempenham atividades das quais não gostam, em algum momento da vida vão sofrer com o casamento, com o convívio social ou com vários outros males psicológicos porque trabalham no que não gostam, só por status, estabilidade, dinheiro ou para agradar aos outros”, diz Isabelle.

Formada em Direito pela Universidade Federal de Campina Grande, Isabelle revela que os alunos que saem das faculdades de Direito estão entre os que mais sofrem porque precisam ser aprovados no teste da OAB, que é tão difícil quanto uma prova de concurso público, abala a situação psicológica desses estudantes em formação e não garante que o profissional vai ser bem remunerado no mercado.

“Fazer a OAB é uma ‘via crucis’. O estudante se prepara na academia e ainda passa por cursinhos, sofre pressão de si mesmo porque só se sentirá um verdadeiro profissional se conseguir essa aprovação e ainda faz uma prova extremamente difícil. Depois de ser aprovado, pode advogar. Porém, muitos têm dificuldades de se dedicar a essa área da carreira e acabam se entregando aos concursos públicos, ou seja, novas dificuldades”, diz a empresária.

Média de idade

De acordo com dados do Ministério do Planejamento, a maioria dos aprovados em concursos do Poder Executivo no país tem em torno de 40 anos; o que não significa dizer que as escolas preparatórias tenham matriculadas, como maioria, pessoas dessa faixa etária. A grande parte dos estudantes que frequentam esses estabelecimentos tem de 16 a 30 anos.

O que parece ocorrer é que os jovens utilizam a energia e a disposição de que são dotados para esbanjar esforço em busca da aprovação, enquanto os mais velhos apostam na maturidade como ferramenta necessária na preparação.

Vagas para 2014

Segundo o Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) adotado para 2014, estão previstas 52.585 contratações por concursos públicos da União, o que vai acarretar um aumento nas despesas com salários equivalente a R$ 2,746 bilhões.

O Poder Executivo vem na frente e é o que dispõe a maioria das vagas, com 42.353 cargos, pretendendo substituir 4.759 cargos de funcionários terceirizados.

Já o Judiciário está autorizado a contratar até 6.330 servidores para ocupar as 2.095 vagas existentes e outras 4.235 criadas para aumentar as ações da Justiça Federal (2.927), Justiça do Trabalho (1.653), Justiça do Distrito Federal e Territórios (835) e Justiça Eleitoral (531).

O Poder Legislativo deve oferecer 931 vagas, distribuídas entre o Senado e o Tribunal de Contas da União (TCU) com, respectivamente, 210 e 65 vagas. A Câmara dos Deputados vai preencher 422 vagas do quadro e deve criar ainda mais 234 funções.

Dicas

A empresária Isabelle Serrano diz que o candidato precisa dispor de tempo, foco e concentração para ter ótimos resultados nos estudos. A internet nem sempre será uma aliada e ficar sozinho no quarto achando que está se protegendo dos concorrentes também não é uma boa ideia.

“Estudar em grupo é muito bom. Você troca conhecimentos, fortalece pontos mais fracos e ajuda outras pessoas. Quanto a estudar pela internet, eu só recomendo se o aluno já souber fazer isso com cuidado. Muitas vezes a internet pode ser um objeto de distração ou estará sempre ali, à disposição, mas não vai ser utilizada porque ele vai dizer que está cansado, precisa dormir, chegou tarde do trabalho. Estudar pela internet só é bom se o aluno estiver devidamente dedicado e com foco nos objetivos”.

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