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Desmemoriamento

Um conselho: não passe para o próximo parágrafo sem espiar, cuidadosamente, a matéria do Jornal do Brasil reproduzida abaixo. Na edição de 2 de dezembro de 1993, com letras garrafais, o JB apregoava a seguinte manchete:

“CPI desvenda esquema de corrupção envolvendo empreiteiras e políticos”.

Aviso de antemão: qualquer semelhança com as manchetes atuais não será mera coincidência. Na verdade, está tudo perversamente conectado.

O esquema descortinado pela CPI – que redundou em indigesta pizza, mantendo o histórico de nossas comissões parlamentares de inquéritos – era comandado por uma inimiga íntima do Brasil de 2017.

Estou me referindo a ela mesma, a Odebrecht.

Ponta de lança de uma organização criminosa que agregava doze empreiteiras – entre as quais figuravam as também “famosas” nos atuais inquéritos policiais OAS, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, Queiroz Galvão e etc -, a Odebrecht montou um poder paralelo para avançar sobre os recursos públicos com a conivência bem remunerada da classe política.

Diante do recorte do JB, o brasileiro de 2017 constata, com a revolta atravessada na garganta, a extensão do dano provocado pela impunidade.

Pois o salvo conduto de ontem alimentou o agigantamento da corrupção de hoje.

São mais de 25 anos – contando a partir do recorte historio do JB – surrupiando o País de forma ilesa. Ao longo de todo esse tempo, a empreiteira se nutriu de seus esquemas e tonificou os números da roubalheira.

O raciocínio é elementar: como não houve castigo para seus crimes, a Odebrecht efetivamente entendeu que estava acima do bem e do mal. E assim se portou.

A lição também é elementar: não podemos perder – de novo – a oportunidade de punir exemplarmente. Pois repetir o erro da impunidade não significa apenas aceitar o dano, mas correr o risco de aumentá-lo.

Devemos, também, combater o equívoco do esquecimento.

Os malfeitores, de uma forma geral, investem pesado no desmemoriamento coletivo. Precisamos, portanto, avivar a memória nacional para afugentar a possibilidade de que corruptos e corruptores emerjam das cinzas para nos assombrar no papel de vítimas.

Somente de olhos bem abertos os brasileiros não voltarão a experimentar, no quarto de século seguinte, desgosto análogo ao que sentimos hoje diante da manchete eterna do JB.

O Brasil do futuro que queremos construir hoje, abolindo a impunidade, chegará com um importante aprendizado:

De que esta é uma nação onde crime tem castigo. E que seus algozes jamais terão direito ao perdão.

Edição de 2 de dezembro de 1993 do Jornal do Brasil

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