Qualquer língua encontra divergências entre os gramáticos, o que deixa em polvorosa o estudante; sobretudo aquele que acredita em tudo o que o professor diz, sem uma ida salutar aos bons livros.
No caso da Língua Portuguesa, as divergências acerca da gramática normativa são muitas. Como, então, saber o que é “certo” e o que é “errado”?
O ponto está em estabelecer o seguinte: o objetivo é utilizar a Língua, no cotidiano (aí, a norma é mais “solta”, admitindo algumas incursões populares) ou estudá-la para concursos, em que os editais deixam claro que a norma utilizada deve ser a “culta”?
Selecionamos, na coluna de hoje, dois pontos de divergências e argumentações que, se não são o ponto de chegada, baseiam-se em argumentos lógicos, do ponto de vista da gramática normativa.
O primeiro deles é sobre a concordância do verbo ser.
Tomemos a seguinte frase:
“Nem tudo são flores na vida”.
Essa é a construção correta, embora, lamentavelmente, alguns professores insistam em dizer, em sala de aula (e há muitos livros de gramática para o segundo grau que assim procedem) que a forma “nem tudo é flores” estaria correta. Argumentam os ditos professores: “as gramáticas dizem que as duas formas estão corretas”. Nenhuma gramática afirma isso (não se deve confundir gramática com livros de gramática para o Ensino Médio). O que as gramáticas afirmam é que a primeira forma é correta, “embora haja inúmeros exemplos em contrário nos clássicos” (Cf. as gramáticas de Adriano da Gama Kury, Celso Cunha e Rocha Lima). Em Rocha Lima e Adriano, um dos exemplos é extraído de um poema de Gonçalves Dias: “Nem tudo é flores no presente”.
Ora, dizer que é certa, embora existam exemplos contrários nos clássicos (leia-se: escritores clássicos; o adjetivo, aí, no sentido de escritores respeitáveis), não é o mesmo que dizer que as duas formas estão corretas.
Resultado fatal para quem faz concursos: se marcar as duas concordâncias como certas (assertivas do tipo a e b estão corretas; ou I e II, etc., errará a questão; e não adiantará entrar com recurso para anulá-la. Quem quiser conferir, basta dar uma olhada em questões dos últimos concursos, mormente, da Carlos Chagas.
Outro exemplo polêmico, ainda relativo ao verbo ser:
A maioria das gramáticas diz que com nomes pluralizados a concordância deve ser feita da seguinte maneira:
Havendo artigo, o verbo concordará com o artigo; não havendo, o verbo ficará no singular.
De modo que teríamos: “Os Estados Unidos destruíram a União Soviética” (verbo concordando com o artigo) ou “Estados Unidos destruiu a União Soviética” (verbo no singular).
Acontece que o respeitável gramático Evanildo Bechara (baseando-se não sei em quê, porque não explica) afirma que no caso do verbo ser, pode-se colocar o verbo no singular ou no plural, mesmo que haja artigo. Para Evanildo, estaria certa a estranha forma: “Os Estados Unidos é o câncer do mundo”.
Acontece que só Evanildo Bechara diz isso, indo contra as ideias dos demais gramáticos respeitáveis desse país. Deveríamos dizer, então, que os gramáticos divergem nesse ponto? Acredito que não. Divergências acontecem quando muitos gramáticos discordam entre si, e não um contra todos.
Posição das comissões de concursos:
O certo é “Os Estados Unidos são o câncer do mundo” ou “Estados Unidos é o câncer do mundo”. Perde a questão quem raciocinar de outra maneira.