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Mães além do câncer: mulheres que ‘vivem’ no Laureano

Era 9h30, do dia 7 de maio, numa sala de espera da ala pediátrica, no Hospital Napoleão Laureano, em João Pessoa. Aproximadamente dez mulheres e algumas crianças esperando para serem atendidas. Entre essas mulheres estavam Valéria, Melita, Milene e Marileide. Mães que deixaram marido, família, emprego e se dedicaram inteiramente aos seus filhos portadores de câncer. Relatos de dor, insegurança, medo, mas também histórias de esperança, fé e principalmente amor.

Dar o máximo de si

Valéria Fernandes, de 41 anos, mora em Cajazeiras, a 468 km de João Pessoa. Ela descobriu o câncer do filho, Miguel Ângelo, de 6 anos, após um tombo. Miguel começou a ter sangramentos nasais e o sangue era escuro e denso. “Começaram a suspeitar de dengue hemorrágica, mas deu negativo para tudo, ele fez ultrassom, raio X, mas não tinha nenhuma alteração. Foi aí que a médica pediu para fazer um mielograma, mas na minha cidade não fazia”, contou Valéria.

O exame só poderia ser feito em outra cidade, então eles foram encaminhados para Campina Grande. Depois do exame feito, a médica revelou ter encontrado “células estranhas” e que não eram compatíveis com o organismo de Miguel, mas compatíveis a leucemia. “Fui logo desabando mesmo. Porque quando você escuta a palavra ‘câncer’, a gente nunca pensa na cura, pensa na morte”, desabafou.

Miguel foi diagnosticado com leucemia mieloide aguda (LMA). É um câncer da linha mieloide dos glóbulos brancos que se caracteriza pela rápida proliferação de células anormais e malignas que não amadurecem, não desempenham sua função e ainda se acumulam na medula óssea.

Após uma verdadeira saga de exames e horas de viagens de uma cidade a outra, Miguel foi encaminhado para o Hospital Napoleão Laureano, para seguir o tratamento.

Com muita emoção, Valéria conta que cria cinco filhos sozinha. E diz o quão é difícil ter que dar conta de tudo, além de ter que dar atenção total para Miguel e lidar com ciúmes dos outros filhos. Porém, ela não deixa de expor sua dedicação a Miguel.

“Ser a mãe de Miguel é um privilégio. Muito difícil para mim, porque ele foi muito planejado, ele sempre foi o xodó da família. De repente ver um filho deitado numa cama de UTI… Você se sente incapaz, como mãe, de fazer qualquer coisa por ele, o máximo que eu posso dar de mim, eu dou”.

Tempo de aprendizado

Apesar do medo ao saber do diagnóstico de câncer de um filho, ainda há mães que tentam encontrar nesse calvário lugar de aprendizado. A missionária Melita Madeira é de Moçambique e veio para o Brasil com o marido e três filhos. O caçula, Augusto, de 5 anos, foi diagnosticado em 2018 com tumor maligno no rim direito e no mesmo ano começou o tratamento com quimioterapia.

“Meu marido veio fazer o curso de Missões Junvep. Depois de seis meses de curso, em junho, fomos para o Piauí para fazer estágio de missões transculturais. Quando fomos para Cabedelo, descobrimos que nosso filho estava com um caroço. Foi de repente, logo de manhã. Levamos ele para o médico e ele descobriu que era um tumor”, relatou.

Melita disse ter ficado assustada com o diagnóstico por não ter conhecimento da doença, porque no país de onde vem ainda não se tem muitas informações sobre câncer em crianças. Mas ela também fala sobre como encara a doença.

“Ele é um menino muito feliz e de muita fé também. Isso que me impressiona. Apesar da doença, apesar de estar toda hora no hospital. Mas ele passa essa segurança e eu estou aprendendo muito nesse tempo com ele. Porque ele é um menino de muita fé”, ressaltou.

“Posso dizer que me sinto mais forte e aprendi muito com a doença de Augusto. Para quem não sabia nada de câncer. E com o Augusto então… Foi um momento de muito aprendizado. Às vezes digo que nada vem por acaso, então foi um momento que eu aprendi e cresci muito com Augusto”.

O silêncio é maior grito que alguém pode dar

Entre silêncio e lágrimas Marileide Barbosa, de 51 anos, conta como  é doloroso ver hoje sua filha, Layane, de apenas 10 anos, sem uma perna. Marileide e Layane moram em Bananeiras, no Brejo da Paraíba.

Layane tinha apenas 5 anos quando começou a ter febres consecutivas e foi levada ao hospital de Guarabira, a 28,1 km de Bananeiras. De lá foram encaminhadas para o Hospital Napoleão Laureano em João Pessoa. Layane foi diagnosticada com osteossarcoma, um tipo de câncer ósseo que começa nas células formadoras dos ossos.

Layane passou por tratamentos de quimioterapia e várias cirurgias. A última delas causando a desarticulação da perna esquerda. Após cinco cirurgias, elas precisam voltar ao hospital para fazer exames de rotina.

Entre lágrimas de gratidão e também pelas lembranças dolorosas que ainda estão guardadas, Marileide silencia sua dor e expõe o amor que tem dedicado à filha.

O encontro com a doença

De acordo com a assistente social do Hospital Napoleão Laureano, Cláudia Oliveira, as mães chegam assustadas. “Apesar dos avanços no tratamento, até hoje o câncer é associado à morte. Essas mulheres esquecem de cuidar do psicológico e se dedicam inteiramente aos seus filhos. Algumas são deixadas pelos maridos quando descobrem que a criança tem câncer e então elas precisam de todo apoio possível”, disse.

Crer na cura

Milene de Souza tem 42 anos e duas filhas. A caçula, Débora, de 3 anos, depois de percurso de exames que não parecia ter fim, foi diagnóstica com rabdomiossarcoma, câncer que atinge os músculos ligados aos ossos. Milene, mesmo com o apoio da família, se sente num campo de batalha.“Foi devastador. E a pior parte são as internações, porque ela não gosta de ficar muito tempo presa ao cateter”, falou.

Viver intensamente a cada dia ao lado da filha é o que traz esperança para Milene. “Sempre tem uma luz no fim do túnel… A gente tem que acreditar na cura. Ela tem cura”.  

“Ser mãe é ser assim

ter tudo que se quer, para doar

doar os próprios sonhos e até mais

ser a gota do oceano do seu filho

tudo fazer, para que nunca o veja naufragar.

(Terezinha Penhabe)” 

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