A má vontade e o arbítrio do “feminismo” criaram uma interpretação extrapolada, absurda e ridícula da clássica letra da música “Ai que saudades de Amélia”, de Ataulfo Alves e Mário Lago.
Desfaremos, na coluna de hoje, o equívoco absurdo que querem impor ao povo brasileiro; sobretudo às camadas mais desprovidas de intelecto.
Vamos à letra:
“Nunca vi fazer tanta exigência
Nem fazer o que você me faz.
Você não sabe o que é consciência
Não vê que eu sou um pobre rapaz…
Você só pensa em luxo e riqueza
Tudo o que você vê você quer.
Ai, meu Deus, que saudade da Amélia
Aquilo, sim, é que era mulher…
Às vezes passava fome ao meu lado
E achava bonito não ter o que comer
E quando me via contrariado
Dizia: “Meu filho, o que se há de fazer…”
Amélia não tinha a menor vaidade
Amélia é que era mulher de verdade.
A letra em questão, diferentemente do que se pensa, não diminui a mulher. Ao contrário: exalta. Exalta a mulher verdadeira, de sentimentos nobres e que está com o marido (ou companheiro) para “o que der e vier”.
Aí, os idiotas dizem: “Essa letra considera a mulher como coisa, quando diz: ‘Aquilo, sim, é que era mulher…’”
Quanta ignorância! Isso é típico de quem desconhece a linguagem figurada; e, mais que isso: até mesmo a linguagem do povo. Quando disse: “aquilo, sim, é que era mulher…”, o poeta exaltou, destacou; distinguiu aquela mulher (Amélia) das outras. É bom lembrar a quem interpreta assim, que, no sertão, por exemplo, quando a gente conhece um homem de verdade, valente, diz: “Aquilo é que é um homem”. Estaríamos chamando o homem em questão de coisa? Somente um completo idiota entenderia assim.
E continuam as interpretações erradas: “Quem já viu alguém achar bonito não ter o que comer?”
Aí, a ignorância chegou ao extremo! O poeta, na verdade, usou uma imagem. Achar bonito “não ter o que comer” quer dizer: entendeu a situação; ficou ao lado do marido; apoiou. Tanto que a imagem é continuada com a linda passagem: “Dizia: Meu filho, o que se há de fazer…”.
Pena que a interpretação errada, equivocada, tomou conta das ruas, e o pobre Ataulfo ficou injustiçado.
Pois digo, meu leitor: Graças a Deus, minha mulher é “Amélia”. Houve uma época, de extrema dificuldade, em que ficamos eu, ela e meus filhos entregues ao desatino. Faltou até comida. E ela sorriu. Não achando graça, é claro, mas tentando minorar meu sofrimento. E disse: “O que se há de fazer?”. E não pensem que ela é submissa.
Ao contrário: Lá em casa, quando ela toma uma decisão, obedeço, à risca. Minha esposa, aparentemente submissa, é “Amélia”: uma mulher de verdade!
* João Trindade | Texto transcrito do livro “Português descontraído”, Editora Leya/Alumnus, 2018, págs. 18, 19 e 20)