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Professores relatam ao MPF ameaças à liberdade de ensino

Professores da rede pública estadual procuraram o Ministério Público Federal (MPF) em João Pessoa para relatar ameaças à liberdade de cátedra (princípio que assegura a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber). Os profissionais afirmam que estão trabalhando sob pressão, acuados e temerosos pela própria integridade física.

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Conforme o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras em Educação do Estado da Paraíba (Sintep-PB), já fizeram reclamações de professores de quatro escolas: Escola Cidadã Integral Francisca Ascensão Cunha (FAC); Escola Cidadã Integral Técnica Pastor João Pereira Gomes Filho (ECIT de Mangabeira); Centro Estadual de Ensino-Aprendizagem Sesquicentenário; e Escola Estadual Cidadã Integral Cônego Nicodemos Neves.

“Todas as reclamações são referentes a algum tipo de retaliação por expressar diferentes metodologias, em especial, quando relacionada à questão da diversidade sexual. No caso da escola Sesquicentenário, as retaliações teriam ocorrido quando os professores abordaram em sala de aula os movimentos sociais”, explicou Felipe Baunilha, membro do Sintep.

A professora de português Angela Chaves participou da reunião no MPF e relatou que uma vereadora da capital retirou do contexto um trecho de um exercício feito em sala de aula e acusou a professora de não saber escrever, ser cristofóbica e intolerante religiosa. “Ela disse que ia abrir um processo contra a minha pessoa e passou uma semana fazendo esses comentários terríveis e mentirosos nas sessões da Câmara Municipal e no dia 29 de outubro, falou mais uma vez no meu nome”, relatou. A professora conta que, após o episódio de superexposição, passou a tomar comprimidos e ir à terapia.

Onda conservadora e subnotificação

Para Felipe Baunilha, existe uma subnotificação dos casos de desrespeito à docência. Ele atribui a situação ao avanço do novo conservadorismo no Brasil, por meio do movimento Escola sem Partido.

“Depois dos ataques sofridos aqui na Capital, professores têm se sentido acuados, temerosos de tratar determinados temas em sala de aula e sofrerem exposição e ataques pessoais, retaliação da direção da escola e das famílias. Muitos professores relatam o medo de abordar determinados temas na escola, afinal, os ataques não são apenas aos conteúdos mas também à figura dos professores”, disse.

Ele orienta que os professores procurem o Sintep para que o órgão representativo da classe possa acionar a Secretaria de Educação e, quando necessário, a Justiça. “Diante da subnotificação, criamos um canal de denúncia dos professores no site do sindicato, para que todos possam solicitar apoio e garantir sua liberdade de cátedra”, informou.

O canal de denúncia de possíveis assédios ou recriminação dentro da escola pode ser acessado neste link.

Professores acusam Estado de omissão

Ainda segundo o representante do Sintep, a falta de posicionamento da Secretaria de Educação sobre os casos deixa os gestores temerosos. “Os gestores não têm se sentido respaldados pela secretaria a desenvolver esta função básica da escola que é estimular o livre debate de ideias”, disse.

O que diz a Secretaria da Educação

Em nota, a Secretaria de Estado da Educação e da Ciência e Tecnologia negou ter sido omissa em relação aos casos de ameaças à liberdade de ensino dos professores. O órgão citou as situações na ECIT de Mangabeira e na FAC e assegurou que deu assistência aos profissionais.

“A Secretaria de Estado da Educação e da Ciência e Tecnologia da Paraíba (SEECT) prestou assistência às Escola Cidadã Integral Técnica Pastor João Pereira Gomes Filho (conhecida como ECIT de Mangabeira) e Escola Cidadã Integral Francisca Ascensão Cunha (conhecida como FAC) na época do ocorrido. O nosso compromisso continua sendo com a educação pública de qualidade e com o futuro dos nossos jovens, lutando sempre pela garantia do respeito e da inclusão, assegurando a integridade e os direitos dos nossos estudantes e professores, assim como a liberdade de cátedra. Continuamos à disposição para diálogo com nossos professores e sindicato da categoria”, diz a nota.

Resoluções

Após os relatos das ameaças e retaliações enfrentadas pelos professores, foram definidas algumas medidas de atuação, dentre elas a realização de uma audiência pública com a presença de órgãos que atuam perante a Justiça em âmbito federal e estadual. A audiência deve ocorrer nos próximos 30 dias com a participação da comunidade estudantil, sociedade civil organizada, entidades interessadas no tema, além de órgãos como o Ministério Público Federal, Ministério Público do Trabalho (MPT), Defensoria Pública da União (DPU), Defensoria Pública Estadual (DPE/PB) e Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Paraíba (OAB/PB).

“Entre as providências a serem adotadas, está uma reunião com o secretário estadual de educação, visto que a situação envolve escolas estaduais, para que ele assegure a liberdade de cátedra e garanta que não haja nenhum tipo de assédio moral aos professores no ambiente escolar”, adiantou o procurador da República José Godoy, destacando que “o assédio organizacional ocorre quando a instituição responsável para adotar as providências contra o assédio moral não as adota”.

Observatório da intolerância

A defensora pública estadual Lydiana Cavalcante informou que a Defensoria Pública da Paraíba, através do Núcleo de Direitos Humanos, está à disposição dos professores que foram ofendidos em sua autonomia didática.

“A liberdade do cátedra não é uma garantia somente do professor, mas também do aluno, que tem o direito de aprender, através de um olhar crítico, e a formar sua opinião com diferentes pontos de vistas e liberdade para se expressar e se desenvolver como um ser social, como preconiza a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente”, defendeu.

Todos os professores que se sentirem violados ou constrangidos poderão enviar denúncias online para o Observatório Interinstitucional de Violências por Intolerância, uma central virtual que recebe e acompanha as denúncias de violências motivadas por preconceitos e atos de intolerância no estado. O sistema recebe casos ocorridos no estado da Paraíba e permite que as vítimas indiquem os agressores e informem sobre a existência de provas. O sigilo das informações é garantido. O observatório disponibilizou um formulário de denúncias online, neste endereço eletrônico. Os registros recebidos são analisados e encaminhados para as instituições responsáveis pela apuração dos fatos e responsabilização dos agressores. A Defensoria Pública Estadual orienta as vítimas juridicamente e acompanha casos graves relatados.

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