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Professor Trindade

Ano de 1975 ou 1976. Os salões do Casinho Maranhense se incendiavam com os acordes do hino do Clube: “É pra valer/é, meu irmão/ ê êêê / todo ano o Casino é campeão.” (…)

Na parte de cima do ginásio, havia uma indiazinha por quem me enfeiticei. Romântico “a la” século XIX, quando colocava os olhos numa garota insistia até conseguir pelo menos falar com ela.

Deixei o salão e fui lá pra cima. A moça dava voltas, e eu, atrás.

– Que quer você?

– Dançar.

– Comigo?

– Sim.

– Tenho namorado.

Consegui, no entanto, dar pelos menos uma volta no salão com ela.

“Amor de carnaval só são três dias…”, dizia a marchinha na minha cabeça.  Acontece que aquele não durara sequer um dia.

Fui dormir com a lembrança dela: o cocar, o corpo deliciosamente moreno, a inesquecível dobra da barriguinha…

Dia seguinte, não iria vê-la; era dia de Lítero ou Jaguarema. Fazia parte do trato, na família: um dia, era num dos clubes da elite; no outro, no mais popular.

No terceiro dia, de nada adiantou o Casino. Não achei minha índia e tive que “aderir a outros cordões”.

Ano seguinte. 1976 ou 1977. Na terça de carnaval, era dia de ir, novamente, ao Casino, uma espécie de Astrea de São Luís. Mais uma vez, o salão “pegava fogo”, e, mais uma vez, estava lá, na parte de cima, a minha índia.

Não era possível! Seria sonho, ilusão, miragem? Ou seria exagero na cota do rum? Não, não era. Eu Acabara de chegar ao clube e consumira apenas metade da primeira dose.

Era minha índia. Subi e me dirigi a ela (seria mesmo ela? Há tantas meninas vestidas de índia no carnaval…):

– Lembra-se do carnaval do ano passado?

– Não. Quem é você?

– Falei com você; você estava com namorado.

– Ah, lembro. Você é aquele paraibano maluco que me arrastou para o salão.

– E o namorado?

– Não existe mais.

Saímos abraçados, os dois; foram beijos, abraços, carícias e outras coisas que o silêncio da crônica fará o leitor imaginar…

O dia amanheceu, anunciando a chegada da “quarta-feira ingrata”. O Casino tinha alguma coisa de Cabo Branco. Ao amanhecer, as pessoas e orquestra saíam em passeata, pelas ruas próximas ao clube, saudando a quarta-feira de cinzas.

Procurei minha índia… Que é de? Sumira. Acabara minha ilusão, naquela aldeia surrealista.

Debrucei-me na balaustrada do rio que passa em frente ao clube, vendo o encontro das águas dele com o mar. Ao longe, a ponte Governador José Sarney, cartão postal da cidade, lembrava-me poemas de Gonçalves Dias.

Pensei em me suicidar, mas depois a lucidez dos ébrios me mostrou que havia uma vida ainda quase adolescente para viver.

Amor de carnaval não merece suicídio.

(Crônica do meu livro “O Estranho Professor de Violão”. Ideia editora, 2022. Págs. 102 a 104).                                                         

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