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Raimundos: rock, ‘nordestinidade’ e política em entrevista ao Portal

Raimundos dispensa apresentações. Uma das maiores bandas da cena nacional do rock, responsável pela autoria de grandes ‘hits’ como “Mulher de Fases” e “Eu Quero Ver o Oco”, dentre muitos outros, está de volta a João Pessoa, após mais de 15 anos, com a turnê ‘20 anos de estrada’, que leva a irreverência de sempre e os grandes clássicos, escolhidos pelos fãs em votação na internet, aos palcos brasileiros e estrangeiros. Formado atualmente por Digão (vocal e guitarra), Canisso (baixo), Marquim (guitarra) e Caio (bateria), o grupo bateu um papo com o Portal Correio sobre o show na capital paraibana e aproveitou para falar sobre diversos temas, sobretudo a situação política e econômica atual e a proximidade que tem com a cultura do Nordeste. A apresentação ocorre nesta sexta-feira (22), no Espaço Cultural, no bairro de Tambauzinho, a partir das 20h.

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Identificação com João Pessoa e relação com o Nordeste

Não é de hoje que o Raimundos está ligado à Região Nordeste e à capital paraibana. A convivência com a cultura nordestina moldou o estilo que a banda segue desde os primórdios. Essa relação é explicada pelos integrantes do grupo:

Digão: “Eu sou filho de nordestinos. Meu pai e minha mãe são piauienses e a minha infância inteira foi viajando para Teresina (PI), de Brasília (DF), escutando forró. Eu gostava quando meu pai botava as músicas do Zenilton (N.R.: cuja música “O Pão da Minha Prima” teve uma versão gravada pelos Raimundos, que o consideram uma grande influência). Eu escutava também Gonzagão, essas coisas, mas quando ele botava forró ‘sacana’ eu me amarrava, eu achava ‘massa’. Aí na volta da viagem eu falava: agora vou escutar Ramones, então rolava uma troca. Vem daí essa mistura”.

Caio: “E ‘neguinho’ fica antenado também nas coisas. Tem um lance legal na música ‘Gordelícia’ (do álbum mais recente, “Cantigas de Roda”), quando se fala ‘ela muscula’. A mãe de um amigo meu, que é nordestina, falava isso: ‘meu filho foi muscular’, referindo-se a ir para a academia, ir fazer musculação, malhar. São palavras que a gente tem que estar sempre guardando”.

Canisso: “A gente é forró demais para o rock’n’roll e rock’n’roll demais para o forró. Então ficamos mais ou menos meio estranhos”.

Um dos melhores exemplos da vivência do Raimundos no Nordeste é a música “Puteiro em João Pessoa”, que narra um fato que, segundo a banda, é verdadeiro e aconteceu com o ex-vocalista Rodolfo na capital paraibana.

Digão: “Foi a inauguração do Rodolfo. Foi a primeira vez que o Rodolfo deu uma ‘bim****’, na companhia do primo ‘safado’ Berssange. É uma história totalmente verídica. Todos os fatos ali realmente aconteceram”.

Canisso: “Para você ter uma ideia, a capital que a gente mais demorou para tocar foi justo João Pessoa. Eu ficava, assim, na paranoia de que a galera de João Pessoa não tinha gostado da homenagem, sacou? Mas, enfim…”

Recepção do rock no Nordeste

Caio: “O Nordeste sempre fica pedindo show para o Raimundos. Muita gente fica mandando mensagem. Quando tem, é bom pra caramba. Não tem um show no Nordeste que tenha sido ruim”.

Digão: “Para vir para o Nordeste é muito caro. Não dá para vir com caminhão, com o nosso equipamento. A gente tem que fazer contingências. É como se a gente estivesse tocando no exterior. Às vezes é até mais caro tocar no Nordeste do que no exterior. Mas a galera aqui é fã mesmo, porque demora para as bandas virem. Então é ‘massa’ porque a galera dá o sangue mesmo. Em Recife (show anterior ao de João Pessoa), a roda (N.R.: também conhecida como mosh pit, é uma movimentação tipicamente circular do público de shows de rock, punk e heavy metal) que tava lá, fazia tempo que eu não via uma roda tão ávida, em todas as músicas, inclusive as novas, que estavam na ponta da língua da galera”.

Canisso: “Na maioria das vezes, mesmo na época áurea do Raimundos, o custo praticamente empatava. A gente fazia com a intenção de querer fazer mesmo, de querer beber da fonte, encontrar os fãs nos lugares mais longínquos, mas é uma produção cara”.

Digão: “O legal é que estamos vindo pela primeira vez com essa formação, que já tem 10 anos. Vai ser ‘massa’, vai ser uma experiência boa. Eu estou curiosíssimo”.

Rock’n’roll nos dias de hoje e a patrulha sobre as letras nas redes sociais

A banda, que sempre foi conhecida pelas letras que, de tão engraçadas, inusitadas e diretas, dificilmente soam forçadas com os palavrões recorrentes que carregam. No entanto, houve um hiato de 12 anos em produções inéditas entre o disco “Kavookavala” (2002) e “Cantigas de Roda” (2014), tendo o grupo lançado, nesse meio tempo, a canção “Jaws” e o disco “Ultraje A Rigor Vs. Raimundos”, um saudável duelo onde as bandas tocavam clássicos ‘adversários’. Nesta segunda década do século XXI, muito do ‘politicamente correto’ inundou o mundo da música e os integrantes dessa esfera já desenvolveram um olhar diferenciado sobre essa realidade, mesmo procurando manter a originalidade de sempre.

Digão: “Cara, hoje o Facebook é um saco. Você não pode falar uma coisinha diferente que ‘neguinho’ vem para cima de você. Mas, no Raimundos, eu acho que se não falarem mal de algumas coisas é porque a gente está fazendo a coisa errada. Reclamaram de ‘Gordelícia’. Foi bom. Na nossa época reclamavam pra caramba também. Mas hoje é diferente, as pessoas se falam mais, todo mundo está interligado”.

Caio: “A gente se preocupa em não deixar uma coisa muito ostensiva. Tem que ter um lance engraçado. Vieram com uma ideia para a gente fazer uma música chamada ‘Bu****lândia’. A gente achou muito agressiva, muito pesada. Não precisa disso. A gente quer colocar um palavrão que fique engraçado, que não soe tão agressivo, que fique uma coisa mais legal de se ouvir, até porque a gente sabe que tem muito adolescente escutando, muita menina”.

Canisso: “Não é para enrubescer, é para arrepiar os cabelinhos do pescoço”, brincou.

Digão: “O mundo mudou desde a nossa época, desde o Raimundos dos anos 1990. Então hoje a nossa relação com os fãs é muito direta. Hoje a gente tem a nossa página, cada um tem sua rede social, a gente conversa, às vezes até discute com fã, tanto politicamente quanto musicalmente. A gente está ali, acessível às pessoas. Eu sempre conversei com todo mundo ‘de boa’, eu sempre mantive meus pés no chão. E hoje, a forma de trabalhar é muito pela rede social. A gente tem um Facebook interessante, com 1,2 milhão de pessoas. Está bom, está legal, não está ruim, e o nosso trabalho é corpo a corpo. Hoje nós não temos muitas rádios de rock no Brasil, mas estamos sobrevivendo super bem porque a gente faz com muita verdade, com vontade e a gente gosta. As pessoas perderam aquele amor que tinham pela música, aquela coisa de ter o disco. Inclusive, para nós que somos banda, é até obrigatório fazer um disco inteiro, mas se você vir os artistas novos, eles não têm disco. O MC Guimê, por exemplo, não tem um disco inteiro próprio. Ele só lança uma música por vez. Então mudou muito a relação do jovem com a música. Nós, que somos da velha guarda, vivemos esse conflito desses dois mundos”.

Momento de crise política e econômica no Brasil

Política é um tema bastante presente no universo do rock. Com o Raimundos não é diferente e, também pela banda ser originária de Brasília, tem tudo para se inspirar com esse tipo de discussão e transformar em canções os questionamentos que faz da sociedade. O tom de protesto, por exemplo, foi adotado na música “Politics”, também do trabalho mais recente.

Digão: “Eu quero fogo na Babilônia”, disparou o vocalista, tratando sobre a política com uma expressão peculiar.

Caio: “A gente quase sai na ‘porrada’ às vezes”.

Digão: “Temos opiniões divergentes. Eu entendo o lado de um e entendo o lado de outro. O problema é o seguinte: se correr o bicho pega, se ficar o bicho come. Essa é a grande verdade. E não tem ninguém fora da política que vai entrar ali e peitar e tomar e mexer. Não tem. Vai fazer o que? Vai ficar parado esperando a Dilma f**** o Brasil para depois vir o Lula como um salvador, com aquela política populista dele, que vai afundar mais ainda o país, mais do que já afundou?”

Caio: “Os políticos que têm que estar brigando uns com os outros. Não é o povo brasileiro que tem que brigar. Não é o ‘coxinha’ contra o ‘mortadela’”.

Digão: “Um puxando a máscara do outro para o povo ver, porque ainda não viu, tanto que está desunido. Tem um povo que ainda acredita muito nessa onda do PT e tem o povo que acha que o Temer vai ser a salvação e a gente aqui sabe que não é nem um e nem outro. A gente sabe que precisa moralizar, mudar leis… é a reforma política. A luta vai ser enorme, mas eu acho que se não começar, e aí, vai ficar como?”

Caio: “Eu queria muito que o povo que defende agora o PT fosse atrás também do Cunha…”

Canisso: “É o que? Al Qaeda? O Estado Islâmico?”, questionou o baixista, irônico.

Digão: “O ‘MSTreta’?”, o vocalista também foi na onda, sempre evidenciando o clima descontraído entre os membros do Raimundos, em qualquer situação.

Na apresentação desta sexta, os trabalhos começam com a banda Dead Nomads, que faz o ‘aquecimento’ do público para Raimundos, que sobe ao palco em seguida. Os ingressos podem ser adquiridos nas lojas Furtacor do Mag Shopping, Shopping Sul e Tambiá. As vendas na internet se encerraram nessa quinta-feira (21). As entradas já estão no segundo lote e custam R$ 35 (pista meia entrada) e R$ 70 (front stage). A entrada de menores de 18 anos ocorrerá mediante apresentação de autorização, com firma reconhecida em cartório.

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