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Unanimidade burra

Lei é para ser cumprida – esta é uma convicção legalista consolidada e contra a qual o cidadão de bom senso não discute nem se opõe.

Mas – e sempre haverá espaços para as conjunções adversativas, mesmo onde a diretriz é não discutir nem se opor – o sistema legal não pode se deixar fragilizar pela incoerência ou matizar pelo irrealismo.

Afinal, lei não é peça milagrosa. Não é instrumento de magia. Não tem o dom do existir para sempre. Nem de equacionar todos os problemas.

Este é o caso da Lei Complementar nº 24, de 7 de janeiro de 1975, que estabelece – para a concessão de benefícios fiscais referentes ao ICMS – a aprovação, por unanimidade, do Conselho Nacional de Política Fazendária.

O Confaz, composto por representantes das pastas de finanças das 27 unidades federativas do País, é, porém, a ilustração da heterogeneidade. Lá estão extremos econômicos como São Paulo e Roraima; Paraná e Paraíba.

E é por isso que a Lei Complementar em epígrafe parece condenada a confirmar que, de fato e de direito, toda a unanimidade é burra.

Pois bastaria que um secretário fazendário mais excêntrico votasse negativamente para barrar ações que poderiam gerar emprego e renda para milhares de brasileiros – especialmente aqueles que moram nos estados historicamente mal aquinhoados com investimentos.

Este é o alerta que fiz há mais de dois anos, mais precisamente no dia 19 de junho de 2012, neste mesmo espaço, quando o Supremo Tribunal Federal determinou a obrigatoriedade do quorum unânime e apontou a ilegalidade das concessões fiscais realizadas pelos estados (mesmo as muito pretéritas).

O martelo judicial ecoou como uma bomba em estados como a Paraíba, onde a restituição dos benefícios promoveria uma quebradeira sem precedentes.

Depois de tantos temores e tremores, ontem finalmente veio uma boa nova. Os parlamentares reunidos na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal aprovaram Projeto de Lei Complementar nº 130 de 2014, que anistia os créditos fiscais já concedidos e quebra a unanimidade nas votações do Confaz.

Se prosperar, o Conselho passará a aprovar concessões de benefícios com votos favoráveis de dois terços das unidades federativas e um terço das unidades federadas integrantes das cinco regiões do País.

O caminho até o bom senso legal é longo. O projeto terá que ser aprovado pelo plenário do Senado e seguir para a tramitação na Câmara dos Deputados, de onde sairá para a sanção presidencial.

O percurso é quilométrico, mas já acende luz no final do túnel, afugentando as trevas que, naquele janeiro de 1975, uma peça legal construída sem preocupação com o futuro das suas zonas de incidência, lançou sobre o Confaz.

Pois a unanimidade de fato é burra, mas – assim como as leis – não precisa ser, felizmente, eterna.

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