A taxação dos super-ricos é um dos pontos centrais dos debates do G20 no Rio de Janeiro, mas a vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais dos Estados Unidos pode dificultar ainda mais o avanço dessa agenda em termos práticos, segundo avaliação do economista Marcelo Neri, diretor do centro de políticas sociais FGV Social.
“Não sou muito otimista quanto aos impactos de curto prazo dessa medida. É uma medida ousada de taxação dos ricos e, por razões óbvias, enfrenta uma certa resistência”, afirma Neri.
“A eleição do Trump, de alguma forma, não só nessa agenda, mas em outras, pode ser vista como um certo balde de água fria. Ele é apoiado por Elon Musk, que se tornou em algum momento recente o homem mais rico do mundo”, completa.
O G20 é composto pelas 19 principais economias do planeta, mais a União Europeia e a União Africana. A cúpula dos chefes de Estado, ápice da programação, está agendada para a próxima semana, na segunda-feira (18) e na terça (19), no MAM Rio (Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro).
Antes disso, diplomatas do G20 fazem a partir desta terça (12), também na capital fluminense, uma série de reuniões para tentar concluir a declaração final do grupo. A previsão é de que essa rodada de negociação siga até sábado (16).
A taxação dos super-ricos é prioridade da presidência brasileira no G20. O tema, contudo, já enfrentou resistências dentro do bloco, inclusive por parte dos Estados Unidos. A possibilidade que se abre com a vitória de Trump seria de uma retórica mais agressiva contra a medida mais à frente.
Durante as negociações para comunicado divulgado em julho, após encontro de ministros de Finanças e presidentes de bancos centrais do G20, o Brasil precisou fazer concessões a fim de incluir uma menção aos super-ricos, sem uma promessa concreta.
Na mesma ocasião, uma declaração específica sobre cooperação tributária internacional afirmou que os países do fórum buscariam se engajar para garantir que os super-ricos fossem taxados de forma efetiva, mas indicou que isso precisaria ser feito com pleno respeito à soberania tributária.
Do ponto de vista econômico-social, outra medida que deve ganhar espaço nas discussões no Rio é a formação de uma aliança global para combater a fome e a pobreza, aponta Neri. Trata-se de outra bandeira prioritária do governo brasileiro.
Na visão do economista, o G20 é o “fórum adequado” para colocar debates desse tipo em pauta, mesmo com as possíveis dificuldades de implementação das ações.
“O G20 tem os maiores financiadores do combate à pobreza possíveis no mundo, e o objeto da proposta de taxação [dos super-ricos] exige uma certa coordenação entre os países”, afirma.
“É o fórum adequado, mas não esperaria um efeito de curto prazo. É mais colocar na agenda, de alguma forma acompanhá-la. Agora, com a eleição do Trump, ficou mais difícil do que já era”, acrescenta.
Ainda de acordo com Neri, é “saudável” para o Brasil voltar a receber grandes eventos internacionais, como é o caso do G20. O economista foi responsável pela organização de um livro lançado em 2021 sobre os impactos das Olimpíadas de 2016 no Rio.
Segundo a obra, o evento esportivo estimulou a cidade em áreas como emprego e combate à pobreza. O município, contudo, não conseguiu avançar em pontos como a despoluição da baía de Guanabara.
“O país tem uma certa importância em termos de diplomacia internacional”, diz. “Um pouco na linha da aliança global, da taxação dos ricos, o Brasil tem tentado de alguma forma ter uma contribuição mais global.”
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