Um dos casos recentes destacado pelo MinC é o da Flip 2018 (Festa Literária Internacional de Paraty), cujos impostos gerados foram superiores aos recursos incentivados pela Lei Rouanet. Estudo feito pela FGV (Fundação Getúlio Vargas) mostrou que o evento, com orçamento total de R$ 3,5 milhões (sendo R$ 3 milhões via isenção fiscal e R$ 500 mil de outras fontes), gerou à União receita de R$ 4,7 milhões em impostos, além do impacto de R$ 47 milhões na economia, com movimentação de hoteis, restaurantes e do turismo local.
“A Lei Rouanet hoje é responsável por orquestras, museus, festivais, com 100% das programações totalmente dependentes da lei porque não temos política para a cultura”, diz Bianca de Felippes, da APTR.
Uma das principais mudanças na lei aconteceu em 1995, quando o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso adotou o slogan “cultura é um bom negócio”. O número de projetos aprovados passou de 69 para 2.552 no ano seguinte, colocando também em outro patamar os valores aprovados e os efetivamente captados pelos produtores culturais.
O setor que mais recebe incentivos pela lei, por exemplo, é o das artes cênicas, que inclui teatro, dança e circo, entre outros projetos — foram R$ 4,5 bilhões recebidos desde 1993, ou 25% dos R$ 17,6 bilhões incentivados pela lei até hoje.
Dados levantados pela APTR apontam que todo o setor cultural, com um incentivo estimado em R$ 1,4 bilhão por ano (somando Lei Rouanet e a Lei do Audiovisual), gera mais de 1 milhão empregos em 260 mil empresas.
Em comparação, a renúncia fiscal para a indústria automobilística, que vai saltar de R$ 2,3 bilhões em 2018 para R$ 7,2 bilhões no ano que vem, beneficia 31 empresas, geradoras de 245 mil postos de trabalho.
Como funciona a captação
Na prática, não é o governo federal quem investe os valores nos projetos culturais, mas, por meio do MinC, o governo seleciona os projetos que poderão ir ao mercado captar os recursos. A decisão de patrocinar ou doar o dinheiro, portanto, é sempre do investidor.
Produtores culturais e investidores (que podem ser pessoas físicas ou empresas sob regime do lucro real) devem seguir uma série de regras para utilizar os recursos do imposto de renda. No caso das empresas (responsáveis por 98,5% dos investimentos), apenas 4% do imposto devido pode ser utilizado — ou seja, pelo menos 96% do imposto de renda dessas companhias será pago à União. O valor que deixará de ser pago depende do tipo de projeto. No caso de música erudita, por exemplo, até 100% pode ser “devolvido”. No caso de música popular, o retorno será de até 30% do patrocínio.
À medida que o dispositivo se tornou conhecido, mais artistas e instituições passaram a utilizá-lo para buscar incentivo: a lei aprovada pelo Congresso não impede nenhum artista de pedir incentivo, seja ele de renome ou iniciante.
Com maior interesse da classe artística, mais empresas também passaram a colocar parte de seu imposto de renda em projetos culturais. Desde 2006, pelo menos 3.000 projetos recebem anualmente recursos via Rouanet. Em valores, o incentivo é de R$ 1,2 bilhão por ano desde 2010, na média.
Grandes projetos
Além de instituições, festivais e exposições culturais, os grandes musicais também entraram nos últimos anos na lista dos grandes captadores. Em 2017, a T4F (Time For Fun) foi quem mais levantou recursos, com R$ 16,4 milhões para duas produções: Os Miseráveis e O Fantasma da Ópera.
Crítico da lei, o presidente eleito Jair Bolsonaro afirmou em setembro, pelo Twitter, que defende incentivos à cultura, mas somente para artistas iniciantes.