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Cultura hip hop como patrimônio imaterial da Paraíba é resposta contra a marginalização da arte periférica

Autoria da lei é da ex-deputada Estela Bezerra (PT), que, após aprovação, avalia teor da regulamentação com muito mais prática pedagógica que punitiva
(Foto: Divulgação / Looney Tunes Crew)

A arte periférica ganhou força e se tornou lei na Paraíba desde o último dia 7 de março deste ano. Para melhor definir: a cultura do hip hop — e todas as suas manifestações artísticas — passou a ser considerada patrimônio cultural imaterial do estado.

A autoria da lei é da ex-deputada Estela Bezerra (PT). O objetivo principal é não só dar uma melhor promoção às manifestações periféricas, mas como também fortalecer o valor identitário ao conteúdo que eles podem oferecer através da arte, promovendo também legitimidade, diante de um cenário muitas discriminado até mesmo pelo poder público.

O texto que declara a cultura do hip hop como Patrimônio Cultural está publicado no Diário Oficial do Estado (DOE) e é descrito de forma clara: “Qualquer ação discriminatória, preconceituosa e desrespeitosa, seja de natureza social, racial, cultural ou administrativo, contra o movimento Hip Hop, submeter-se-á às penas da Lei”.

Breaking, Graffiti, Rap, MC, Batalha de MCs, SLAM, Conhecimento, Beatbox e outras vertentes artísticas também fazem valer a mesma conduta pedida no deferimento da lei.

“A lei deve de imediato servir para o melhor tratamento do movimento estético que se expressa as linguagens artísticas praticadas pela juventude da periferia, onde a sua grande maioria é negra. A lei deve favorecer o acesso e apoio e o respeito das instituições públicas para realização principalmente das batalhas e de outras manifestações em praças públicas. Durante o ano passado acompanhamos a tratativa das batalhas de rappers para ter autorização das praças e também a assédio da polícia na Praça da Paz (no bairro Bancários). É importante que essas instituições conheçam a lei, que tem um teor mais pedagógico que punitivo”, disse Estela Bezerra, autora da lei.

Estela Bezerra, autora da lei que tornou cultura do Hip Hop patrimônio na Paraíba (Foto: Arquivo/ CORREIO)

Artistas comentam sobre lei

”As práticas, representações, expressões, conhecimentos e técnicas — junto com os instrumentos, objetos, artefatos e lugares culturais que lhes são associados — que as comunidades, os grupos e, em alguns casos, os indivíduos reconhecem como parte integrante de seu patrimônio cultural”, diz um trecho do texto no Diário Oficial do Estado.

O alcance dessa legislação agora é um desejo que os artistas das mais diversas denominações do hip hop querem ter como respaldo. A ideia que essas manifestações possam ser postas nos espaços que possam alcançar, porém, ainda é uma dúvida que só será tirada ao longo de uma rotina que ainda é de muita luta.

Recentemente, o breaking dance, um estilo de dança que ganhou visibilidade por estar ligado à cultura urbana do hip hop, fez história ao se tornar também esporte olímpico. Na Paraíba, o grupo Looney Tunes Crew é referência por ser multicampeão regional nessa agora modalidade. Eles já colecionam destaques neste cenário há 15 anos.

O líder do grupo é Wesley Silva, conhecido artísticamente por Bboy Mago, que destacou que, apesar da aprovação da lei, o poder público só dispôs apoio a eles somente em uma oportunidade. A torcida, da publicação em diante, é para que essa realidade mude.

“Fomos selecionados num edital uma vez (para receber incentivo do poder público). Essa é uma realidade corriqueira. Por ser uma arte originalmente periférica, é comum que sempre exista algum tipo de preconceito, pelo fato de não conhecer ou por associar a algo ruim, pois também existe os adeptos que utilizam a cultura de forma errada. (Espero) Que o leque de oportunidades cresça, gerando oportunidades para que possamos nos profissionalizar cada vez mais”, comentou o Bboy Mago.

Looney Tunes Crew é um dos grupos de breaking dance mais conhecidos do Nordeste (Foto: Divulgação / LTC)

A reportagem do Portal Correio também conversou com um outro amante da arte na rua, que é rapper, compositor e crítico do que acompanha e vivencia no cenário de João Pessoa. Ele, que não quis se identificar, critica a conduta das forças de segurança pública em eventos.

“A lei depende muito também da gente que faz parte. Dizer que agora que temos uma lei que nos protege vai melhorar a nossa relação com a polícia e os poderes públicos é mentira, porque a gente já sabe que vai vir um monte de censura. Não para dizer que não vai ser importante. O hip hop é dedo na ferida, mas não vai passar em nada que for com o governo, que vai vetar o hip hop combatente”, disse.

O rapper também alfineta sobre a falta de incentivos da iniciativa privada, que, segundo ele, se alimenta da cultura que o cenário promove e pouco oferecem de apoio como retorno.

“O que a gente fica triste é por falta do apoio da galera da iniciativa privada, com empreendedores que ganham dinheiro com elementos da cultura, mas que, quando você vai pedir apoio, não chegam junto”, acrescentou o rapper.

Skate
Praça do Coqueiral, no bairro Mangabeira, recebia várias batalhas musicais, mas participantes sempre se queixaram de mau tratamento da Polícia Militar na abordagem do público (Foto: Google Street View)

O que diz a Polícia Militar

O contato com a Polícia Militar teve resposta breve e objetiva. A ideia era tão somente buscar informações sobre a abordagem que o público e os artistas, que vivem e consomem o hip hop, recebem nas mais diversas manifestações artísticas que acontecem em João Pessoa. A solicitação foi feita via e-mail, com o intuito de ouvir o comandante da PM, o coronel Sérgio Fonseca. A resposta veio também por e-mail, só que pelo setor de Comunicação Social da entidade.

“A Coordenadoria de Comunicação Social da PM informa que a Polícia Militar continuará atuando para garantir a segurança em eventos públicos e manifestações artísticas de qualquer natureza, incluindo as do patrimônio cultural imaterial como hip hop, forró, ciranda, coco de roda, mazurca, entre outros ritmos. O trabalho da corporação é pautado na prevenção dos ilícitos, na legalidade e na colaboração com a sociedade. Desde janeiro, através do site institucional, a corporação disponibilizou um canal digital ágil para solicitação de policiamento para segurança em eventos e festas públicas na Paraíba, contribuindo assim na prevenção dos delitos”.

Saiba mais sobre a nova lei:

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