“Quando tinha uns três anos, comecei a brincar com a bola e virou minha paixão”. As palavras são de Kauã Guimarães, de 10 anos. Assim como ele, centenas de brasileiros começaram o sonho apenas em contato com a bola. Não à toa dizem que o futebol corre nas veias do brasileiro.
Apaixonado por futebol, Kauã traz para si a paixão nacional, quando assiste aos ídolos jogar e pratica na escolinha o que almeja ser, um jogador profissional de futebol. O que ele vivencia hoje já foi realidade de craques como Zico, pelo Flamengo; Ronaldo, no Cruzeiro; e Neymar, pelo Santos.
Seja na tradicional várzea, no chão de terra batida ou nos campos modernos de grama sintética, na pelada de quarta e domingo. É sagrado! E dessa paixão que passa de pai para filho, de geração em geração, nossos jogadores vão se renovando. A escola do futebol brasileiro é farta e gloriosa.
O futebol desperta nas crianças a vontade de ser como os ídolos. João Ventura Crispim, de 13 anos, e Kauã Guimarães são apaixonados pelo futebol. Eles seriam a nova geração de futuros jogadores brasileiros. Tanto João quanto Kauã não titubeiam quando perguntam quem é referência nos gramados: “Messi!”
O argentino também passou pelo mesmo processo que João e Kauan. Messi começou nas categorias de base do Newell’s Old Boys, em Rosário, na Argentina, e com 14 anos foi para o Barcelona, se aperfeiçoou e hoje é considerado um dos melhores do mundo.
Com esse DNA cultural, crianças e adolescentes crescem influenciados pelo futebol. Existem aqueles que crescem e são determinados a seguir profissionalmente na carreira de jogador de futebol, participando de peneiras e disputando torneios com clubes, elevando sempre em busca do objetivo principal. E outros que são apaixonados por futebol, mas que preferem apenas assistir pela televisão e ser presente em cada jogo no estádio, para comentar na escola, na roda de amigos, no trabalho. Querer seguir na carreira ou querer acompanhar como torcedor são formas de vivenciar o futebol.
São diversos os espaços para a prática do esporte. E nessa pluralidade de locais que surge o futuro do futebol brasileiro: a base. O período de amadurecimento, a formação… Desde cedo as crianças aprendem a se divertir e transformam um toque na bola sem rumo, com um sorriso no rosto de quem só quer brincar, em um jeito técnico que pode mudar a vida.
Espaços como as escolinhas de futebol buscam ensinar fundamentos e noções de competição para a garotada. A renovação é constante e com o crescimento das escolinhas e alta procura por parte dos pais, a tendência é que mais jogadores surjam no cenário profissional. Estar numa escolinha de futebol não se resume apenas a jogar e fazer gol. Valores fora dos gramados são importantes e devem ser ensinados desde cedo.
Para o profissional de Educação Física e coordenador de esportes em uma escola particular de Campina Grande, Válbio Leite, ensinar o futebol e valores sociais para as crianças desde cedo é muito benéfico para a construção de ideais.
“O futebol na infância traz ensinamentos importantes, como socialização e disciplina, além de contribuir para afastar dos pequenos hábitos sedentários, que prejudiquem a saúde. Isso porque, durante as atividades, as crianças têm a oportunidade de conviver umas com as outras; aprender sobre limites; obedecer regras; desenvolver capacidades cognitivas e motoras, bem como vivenciar experiências que, em um contexto de diversão, contribuem para o crescimento saudável. Vale salientar que uma grande vantagem de iniciar a prática esportiva, ainda na infância, é que isso é fundamental para o desenvolvimento de técnicas e habilidades que possam vir a melhorar o desempenho das crianças, caso elas optem por dar continuidade à prática esportiva ao longo da vida ou até mesmo nas situações cotidianas, como saber lidar com situações de vitória e derrota”, salienta.
As escolinhas, de modo geral, oferecem, além dos treinamentos e oportunidades de competir, situações de integração e sociabilidade, algo que a psicologia enxerga como positivo na construção de valores pessoais. A psicóloga Silmara Moreira, com atuação em terapia cognitiva comportamental, analisa como benéfica a prática do futebol pelas crianças. “Os benefícios são múltiplos, a criança vai trabalhar dicção, ela vai aprender a se comunicar, para haver a interação social.”
A convivência com outras crianças é fundamental para o desenvolvimento cognitivo e social. “A criança vai trabalhar questões como a agressão, violência, liderança, dinâmica do grupo, são temas que crianças que estão tendo contato com outras da mesma idade aprendem a trabalhar, a desenvolver e fazer com que convivam umas com as outras”, salienta a psicóloga.
A participação dos pais é de fundamental importância no acompanhamento do filho no desempenho escolar e no incentivo à prática de esportes. Juliana Guimarães, 38 anos, mãe de Kauã, cita a importância de colocar o filho na escolinha e o desenvolvimento técnico e social dele.
“Para mim é muito importante por conta do desenvolvimento social, interage (Kauã) com outras crianças, tem a questão do físico, que ajuda a fortalecer a musculatura e que ele gosta muito de participar de campeonatos”.
Conciliar a escola com o esporte é de suma importância para o desenvolvimento cognitivo e social da criança, que aprende questões como disciplina e sociabilização. “A primeira instância que coloca esse freio no desenvolvimento infantil é a escola, para aprender o que são regras, o que é o social, o que é direito e dever. A segunda instância é o esporte, e é ainda melhor porque estará trabalhando algo que a criança gosta, ela aprende o que são regras e traz esses aprendizados para o campo social também”, salienta a psicóloga Silmara Moreira.
O apoio dos pais é fundamental para a autoconfiança das crianças. Segundo João Ventura Crispim, o maior apoiador em casa é o pai. “Meus pais sempre me incentivaram porque eles sabem que esse é o meu sonho e que eu almejo muito!”, explicita João. A mãe de Kauã, Juliana, se sente realizada ao ver o filho praticar o que gosta. “Inicialmente esse é o sonho dele, de ser jogador de futebol, e para mim eu amo participar, eu amo assistir, ele fica nervoso quando eu venho, eu adoro, é sensacional”, finaliza Juliana, emocionada em ver o filho feliz e fazendo o que gosta.
Algumas escolinhas de futebol na Paraíba se destacam por revelar jogadores, pela atuação em projetos sociais e modelos de integração social. Veja algumas abaixo:
A Escolinha do Treze também faz esse papel de fundamentar as crianças que estão começando a gostar do futebol, por volta dos três anos de idade, até os 14 anos. Durante esse período, o foco maior é na parte dos fundamentos, ensinar as regras básicas do futebol, ensinar como chutar na bola, como obedecer taticamente. A função da escolinha é preparar os jovens atletas para estarem prontos para serem integrados pela base oficial do clube.
A escolinha também tem a preocupação com o desempenho do atleta na escola. Segundo Ítalo Nascimento, professor e coordenador da escolinha do Treze, é fundamental o atleta estar bem na escola.
“A parte social e educacional é um dos campos primordiais da nossa escolinha. Primeiro para a criança vir, para ela treinar, a gente pergunta logo como está na escola, nós acompanhamos, é uma dosagem, tanto nossa quanto dos pais, a gente estimula eles a estudar para eles virem praticar o esporte”, salienta Ítalo para a importância do bom rendimento na escola.
Ítalo ainda explica que é de fundamental importância o papel da escolinha de futebol, no modo geral, para o aprendizado de vida das crianças. “É uma escola de aprendizagem, então o papel dela é importantíssimo porque a diversão dos meninos é o futebol, é aprender futebol, então a gente tem que saber dosar isso para mostrar a eles que para ter o futebol é preciso ter educação, para ter futebol tem que saber respeitar o colega, o trabalho é em cima disso”, finaliza.
O projeto surgiu no início do ano de 2018, a partir de uma ideia do jogador Victor Ferraz, atualmente no Grêmio-RS, de poder ajudar e dar oportunidade para os meninos de João Pessoa (e abranger todo o Nordeste) de treinarem em um local organizado, jogarem grandes competições e realizarem seus sonhos, além de se formarem cidadãos e se afastarem de possibilidades negativas.
Os jogadores são recrutados através de seletivas que acontecem em várias cidades do Nordeste, incluindo uma seletiva anual que acontece sempre no mês de dezembro em João Pessoa. Além disso, a equipe de captação observa competições de base pela região e acompanha diversos projetos sociais e escolinhas.
O ritmo de treinamentos do Projeto VF4 é baseado nos moldes das equipes referências do país. As categorias maiores treinam praticamente todos os dias e as menores no mínimo três dias por semana visando a evolução dos atletas. O local dispõe das categorias sub-13, sub-14, sub-15 e sub-17.
Para o diretor geral do VF4, Pedro Ferraz, além do campo, o projeto também se preocupa com o social e o desempenho dos atletas na escola. “O projeto se preocupa muito na formação social dos jogadores, realizando palestras constantes com pessoas do meio. Sem esquecer na exigência de que todos os atletas estejam matriculados e tenham frequência na escola, que é de suma importância”.
A Escolinha Livro na Mão, Bola no Pé existe há 22 anos e se localiza na cidade de Solânea, no Curimataú do estado. Em sua história, a escolinha já participou de vários campeonatos, como a Copa Rural, Copa Paraíba, Copa Integração, todos em âmbito local. Atualmente tem feito um trabalho voltado mais para os fundamentos dos jovens. A Escolinha conta com 120 alunos, distribuídos em 3 categorias: pré- mirim, mirim e juvenil.
O professor e coordenador da escolinha, Ronaldo Tomaz, enfatiza a importância da prática do futebol desde cedo pelas crianças e se diz orgulhoso pelo trabalho e revelações que a escolinha do interior da Paraíba produz.
“O futebol desde cedo desperta várias habilidades, as crianças vão descobrindo com o que se identifica, aprendem a interagir com os colegas, a tomar decisões. Temos experiência de como o futebol ajuda no desenvolvimento da criança. Hoje somos orgulhosos do nosso trabalho e dos atletas que estão apontando como profissionais, seja a nível estadual ou nacional”, frisa Ronaldo.
Filho do professor e coordenador, o jogador Luís Henrique, atualmente atacante do Botafogo-RJ, teve seu início de carreira na escolinha de Solânea, sendo uma referência para o futebol local.