“Quando eu entrei, o pessoal não sabia que eu estava gestante. Agora algumas pessoas sabem, porque quando me inscrevi foi logo no começo. Eu estou aqui porque preciso do dinheiro para comprar o enxoval, preciso do dinheiro para pagar contas. Eu estou dando graças a Deus por ter conseguido”, disse Simone Pontes. A mulher de 34 anos está gestante há três meses e atuando no primeiro ano com a equipe da limpeza do Parque do Povo, no São João de Campina Grande. Por trás do brilho e do glamour da festa, estão Simone e outras várias pessoas que fazem o Maior São João do Mundo acontecer.
Simone estava desempregada quando surgiu a oportunidade de fazer a inscrição para trabalhar durante o São João 2019. Ela está na equipe desde o dia 7 de junho e, junto com os outros 269 selecionados para a função, trabalha até o dia 7 de julho para receber um salário mínimo, que está em R$ 998. Simone disse que, mais do que nunca, precisa do dinheiro.
“Fiquei bem feliz quando fui contemplada, quando fui chamada. É o meu primeiro ano com muito trabalho e muito esforço. Aqui todo mundo é muito bem tratado e todo mundo se respeita, o que é fundamental. Eu pego de 7h às 18h, já o pessoal do turno da noite chega às 18h e sái às 7h”, afirmou Simone.
Conforme a Secretaria de Desenvolvimento de Campina Grande, cerca de 270 pessoas estão trabalhando na limpeza do Parque do Povo na edição 2019. São 24 horas de trabalho divididas para atuação de duas equipes, nos turnos do dia e da noite, o que culmina em uma média de cinco toneladas de material coletado por dia.
Entre as pessoas responsáveis pela limpeza, cerca de 40 trabalham diretamente com a reciclagem. Todo o material encontrado cotidianamente resulta em pouco mais de uma tonelada reciclável.
Ainda segundo a Secretaria de Desenvolvimento, o São João de Campina Grande é oportunidade para empregar cerca de 140 ambulantes de bebidas que atuam no Parque do Povo e mais 70 ambulantes em diversos seguimentos.
Essas pessoas, não são as atrações principais das noites de festividades, mas são fundamentais para fazer o evento acontecer.
Simone é natural de Campina Grande, mora no bairro Bodocongó, na Zona Oeste da cidade. Ela estudou até o ensino fundamental e já trabalhou como cuidadora de idosos e como babá. Fora isso, só conseguiu emprego uma vez em uma padaria, onde passou somente duas semanas. Simone, que precisa do trabalho para a chegada do terceiro filho, já é mãe de duas meninas.
Sobre as expectativas para o fim do São João, ela não esconde que quer continuar trabalhando. “Se aparecer outro trabalho, eu quero trabalhar até a criança nascer. Eu preciso. Eu gosto muito de trabalhar com idosos e eu trabalho principalmente em hospitais, passo noite e dia no hospital quando me chamam. Se aparecer alguma oportunidade assim, eu vou pegar”.
“Trabalhei na roça, trabalho este que me orgulha. Hoje eu sou a pessoa que sou devido a esse trabalho, pois desde cedo soube o que era ter responsabilidade”, disse Maria da Guia, ou Guia, como é conhecida, de 44 anos, natural de Juazeirinho, no Cariri paraibano, onde viveu a maior parte da infância. Ela é vendedora no Parque do Povo.
Guia, que se orgulha de ter nascido e trabalhado no sítio da cidade natal, veio para Campina Grande aos 11 anos, onde se formou na escola até o terceiro ano do ensino médio. A mulher ainda é mãe solteira de dois filhos, dos quais não esconde, são seu maior orgulho.
Ao ser questionada sobre o que significa atuar com vendas no Parque do Povo, ela deixou claro o que visa. “Vejo no São João a oportunidade de ganhar um dinheiro extra para investir nos estudos dos meus filhos, para pagar contas e ter uma renda extra. Eu sou mãe de Amanda, que tem 23 anos, e de Felipe, de 19. Amanda estuda inglês na UEPB e Felipe trabalha com artesanato”, colocou.
“Trabalho há nove anos no Parque do Povo como comerciante, atendo em um quiosque. Eu já trabalhei por 12 anos em restaurantes, foi onde peguei gosto pela culinária. Em um certo tempo, cheguei a abrir uma marmitaria, mas não deu certo, acredito que esse foi meu desafio na vida profissional”, contou.
Para manter a renda ativa durante o ano, antes e após os 31 dias de São João, Maria da Guia trabalha como empregada doméstica. Durante o São João, ela tira férias da atividade e aproveita para investir nas vendas do Parque do Povo. Mas Guia contou que, durante as folgas do trabalho, ela também faz almoços, jantares e congelados. “É só ter serviço que estou lá. Amo minha profissão”, coloca.
Sobre os pontos negativos para atuação no Parque do Povo, ela esclareceu que, em geral as pessoas mais afetadas por eles são as que estão atuando do lado externo. “É muito triste ver meus companheiros de trabalho esse ano terem ficado num lugar externo, onde não tem nenhum atrativo para que eles possam vender melhor, poderiam estar atuando dentro, porque todos fizeram investimentos acreditando nas vendas e não estão obtendo lucros nenhum”, lamentou.
“A crise que enfrentamos esse ano é um desafio, mas nada comparado ao São João 2018, quando diversos desafios foram apresentados, inclusive o incêndio ocorrido em 30 de junho de 2018, que destruiu 30 pontos comerciais do Parque do Povo. Até hoje os comerciantes atingidos pelo incêndio não foram devidamente ressarcidos”, relembrou o comerciante Lucinei Cavalcanti, de 39 anos.
Lucinei é presidente da Associação dos Comerciantes do Maior São João do Mundo. Ele trabalha com comércio há 20 anos e está no Parque do Povo há dez. No município de Campina, ele também tem um delivery de comida chinesa e comida regional nordestina. Segundo ele, o Parque do Povo é uma vitrine, que oferece estrutura e com um bom fluxo de pessoas. Além disso, Lucinei afirma que enxerga o local como expressão da cultura nordestina.
Ele ainda atua como professor de administração em universidades da cidade. É formado em Administração Pública e de Empresas pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) e em Comunicação Social, pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), tem especialização em Gestão Estratégica de Pequenas e Médias Empresas pela UFCG e mestrado em Ciências Sociais.
Com um olhar empreendedor e a visão de atingir demais comerciantes do Parque do Povo para o caminho profissional, Lucinei contou que, quando a associação foi criada, em 2014, a intenção não era só representar uma classe que trabalhasse na festa, mas de contribuir com a profissionalização dos comerciantes.
“Para que enxerguem além de um meio de pagar as contas ou receber um décimo terceiro durante o ano, a gente quer que eles enxerguem essa questão de divulgar um negócio externo que eles tenham. Nós tivemos cursos de atendimento e vendas que oferecemos pra eles. Este ano, com o programa Empreender Paraíba, além dos R$ 2 milhões de empréstimos investidos, tivemos capacitações para eles, para que saiam do amadorismo para o profissionalismo. O objetivo maior foi esse, o de transformar todos em empreendedores”, contou.
Conforme Lucinei, ainda há pessoas que tiram subsistência do trabalho comercial no Parque do Povo, mas com o investimento da associação, o quadro tem se invertido. Os comerciantes estão se tornando mais empreendedores, pessoas que tem um quiosque dentro, por exemplo, e que já andam pensando em abrir negócio fora. Pessoas que estão planejando crescer.
“A gente abriu o financiamento público com o estado (Empreender Paraíba) entregamos um ofício e o governador viu que se encaixava com o programa, então deu certo. Além disso, ainda conseguimos o financiamento privado de uma cooperativa de crédito daqui de Campina e também de um banco nacional que tem uma linha de crédito para microempreendedores. Nunca na história do São João houve algo assim, com financiamento das atividades daqui, então essas ações tem mudado a realidade dos comerciantes, muitos deles só conseguiram colocar seus pontos comerciais esse ano por causa disso,” finalizou.
Sob sol e chuva, dia e noite, os trabalhadores do Parque do Povo garantem o funcionamento nos bastidores da festa, sem serem muito notados por quem a frequenta e apenas espera pela atração dos palcos. Nessa festa, o palco principal também é dessa turma!